domingo, 5 de diciembre de 2010

Ego vs Alter

Tatu
Após descer dois terços das escadas intermináveis até o trem, ouço uma batida conhecida… tata tatata tatatata… Parecia que tinha uma TV ligada em algum canto, transmitindo os especiais de fim de ano da globo.
O cantor de música brega da estação Príncipe de Vergara tem Roberto Carlos em seu repertório. Versão dublada em espanhol, é claro.
Dois días depois no mesmo ponto na estacão Príncipe de Vergara, um clarinete, bem diferente da voz estridente de antes. Tocava tico-tico no fubá. Lindo, lindo, lindo…
Black hole
Não sei se é o frio, as preocupações das últimas semanas, a impossibildade de resolver tantos probleminhas, a aproximação das festas de fim de ano ou tudo isso junto, mas entrei numa fase de introversão… me sinto como um buraco negro engolfando tudo ao seu redor desde estrelas brilhantes e belas até o pó mais sujo e desprezível. E assim tenho passado estes últimos días entre o sublime e o mundano, a alegría e a dor, a excitação e o tédio. De tudo isso me saturando. Invevitavelmente. Constantemente. Crescentemente.
 Prevejo explosões cósmicas em breve.
               
              Meu nome não é Telma.
                Eu realmente sinto se é uma decepção viver comigo, mas meu nome não é Telma. Se a Telma era a sua melhor amiga no mundo, bem, talvez ela não deveria ter ido embora. Mas ela foi, buscou outra vida e agora eu estou aqui ocupando o espaço que antes era dela. E, por mais que você não goste, este espaço agora não é mais da Telma. É meu.
A Telma fazia as coisas de tal jeito e você já estava acostumada, não é? A Telma tinha uma vida tão torpe quanto a sua, não é? Mas agora ela não tem mais, e quase nunca te vê. Mas de qualquer maneira, dá na mesma. Porque eu não sou a Telma. Tampouco quero ser a Telma. Porque a Telma é uma pessoa que não sou eu. Sei que e muito complexo, mas você pode entender?   
A Telma e você tinham algo especial, ela fazia o que você mandava e o que você quería. Eu também deixei amigos tão especiais para trás. Mas eu não sou a Telma. E não é que eu faça as coisas do jeito errado, não é mesmo? É que simplesmente eu sou a pessoa errada. Sinto informar-lhe, mas eu vim para ficar e esse “jaleo” todo não mudará minha resolução, ainda que me faça viver sobre um chão de ovos que você arroja diariamente sob os meus pés. Mas ainda assim, eu não sou a Telma. E simplesmente não há nada que você possa fazer.
Prazer, meu nome é Raquel.

lunes, 22 de noviembre de 2010

La risa, el llanto y las hormigas de Don Ramirez

Anúncio:
Se você não foi seleccionado para o programa ídolos, não se desespere, você ainda pode ter um futuro brilhante como cantor. Venha cantar no metrô de Madrid, cada estação é uma festa – e às vezes mais de uma!
Tem um músico te esperando em qualquer hora do día em todos os cantos da cidade! (é sério outro día achei até um chinês tocando shemisen; foi surreal, parecía que eu tinha entrado no metrô da Calle de Alcalá e saído em Pequin).
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Hoje tomei um susto tão grande que quase caí para trás. Passei por uma esquina repleta de pôsteres apologéticos à Falange, convidando a todos para um ato contemplando sua memória histórica (tinha até uma foto de um dos membros mais proeminetes). Os funcionários do estabelecimento – era um banco – lavavam as janelas com agua e sabão na tentativa de remover os cartazes. Um calafrio percorreu a minha espinha.
Mas aí depois tive uma idéia para um samba-enredo: “Olha os movimentos neo-fascistas aí, gente!”

Estive correndo no parque e na volta, justo quando estava entrando na rua de casa, começou a tocar uma versão de “Felicidade” que tenho em meu ipod, interpretada por Caetano Veloso. Essa é a única música que eu me lembro de ouvir minha mãe cantando para mim quando era pequena, para me fazer dormir. Tive que apertar o passo para não desabar no meio da rua mesmo. E também não consegui simplesmente passar para a música seguinte.
Cheguei no prédio, mal disse “oi” pro porteiro, peguei o elevador, entrei em casa, tranquei a porta atrás de mim e chorei como uma criança que perdeu a mãe no supermercado.
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  Rezava a lenda aquí no apartamento que o propietario do imóvel (vamos chamá-lo de Don Ramirez, para efeitos narrativos) era na verdade um holograma ou o amigo imaginário da agente imobiliária (vamos chamá-la Dolores, também para efeitos narrativos). Foi então com muita surpresa que descobri que Don Ramirez não era virtual, embora seja sim uma espécie de entidade. Após passar pelo saguão coberto de mármore do chão ao teto o porteiro me indicou o elevador. Este, era um show a parte, de madeira e vidro, antiquíssimo, mas super bem conservado. Ao chegar em seu escritorio a secretaria me atendeu, e levou os papéis a serem assinados até a sala de Nossa Santidade. Não fui convidada a entrar, afinal quem sou eu além de uma formiga diante de Don Ramirez? Ali fora onde estava, fotos de crianças bem nutridas sorrindo com os cabelos molhados. No iate do vovô, talvez. Momentos de tensão e suspense… um vislumbre! Um homem careca de meia idade sentado atrás de uma tela gigante rodeado de objetos e móveis caros. Sai a secretária, papéis assinados em mãos. Uma assinatura de homem importante mesmo!
Ao pegar o elevador, desta vez para descer, olhei para os anjinhos renascentistas pintados no teto. Quase podia ouví-los cantar.

 

jueves, 18 de noviembre de 2010

La Batalla de Espartinas

Dia 20 de setembro de 2010 uma forasteira chegou a Espartinas de mala e cuia ( e bota mala nisso!). Não só era ela uma forasteira, mas vinha ocupar uma área tradicionalíssima, tomar para si um lugar cobiçado não apenas na capital, mas em todo o país. E quem é ela? É uma forasteira peculiar… Ela até se parece com eles. Freqüenta os mesmos lugares que eles e às vezes fala e se comporta como eles. E cada vez mais ela se mescla ao mundo deles, e esse mundo se torna parte indissolúvel dela mesma…
E eis que ela está prestes a tornar-se uma deles. Pelo menos jurídicamente. E quanto mais ela se aproxima deste feito, mais eles se assustam, pois afinal, como poderão diferenciá-la deles próprios?
Quase dois meses ela leva uma batalha estúpida com aqueles que estão tentando em vão dissuadí-la – pelo cansaço – de alcançar este que é não só um capricho, mas um direito que ela tem. E uma necessidade.
Lançaram-lhe prazos intermináveis, taxas que não existem, advogados… todas as suas armas mais mesquinhas. Felizmente, fez aliadas que souberam orientar-lhe bem, que sabiam melhor que ela como lidar com tais empecilhos.
Esta semana finalmente perdeu as estribeiras. Usou as únicas armas das quais dispunha: a voz e a razão. Educada, mas firmemente, exigiu que o oponente lhe entregara o que já era dela desde o começo. E ponto. Afinal, se o jogo fosse ser desleal mesmo, ela entraría nele com unhas e dentes, ainda que desgostosa. Mas achou que por bem, seria elegante dar-lhes uma última chance de fazer a coisa do jeito certo e civilizado.
Parece ter funcionado. O primeiro passo já foi dado. Mas nesse ínterin, muitas complicações aconteceram, eles a lesaram financeiramente e dificultaram sua vida. Não tem problema… nada que não tenha solução a médio e longo prazo. Ela, a pesar das intempéries ganhará a batalha, pois tem a verdade pura e simples ao seu lado. E eles, tudo o que conseguiram foi fazer uma inimiga.

domingo, 14 de noviembre de 2010

El placer y el dolor

Sábado foi decretado o dia oficial de presentear a mim mesma com um doce. Não que eu só coma doces aos sábados, durante a semana eu consumo em média 1 barra de chocolate e algumas bolachas recheadas, mas isso faz parte da minha compra do supermercado. Aliás, vendem umas bolachas absurdas no mercado aquí perto; é de uma marca genérica e por isso é super barata, mas é um biscoito de manteiga coberto com chocolate ao leite – não recheio de chocolate, CHOCOLATE mesmo. Como se diz aquí “me flipo en colores” por causa dessa bolacha. Mas enfim, como eu dizia, todo o sábado vou a uma destas docerias super sedutoras que tem aquí em Madrid e me concedo o prazer de provar uma das delicias expostas no balcão. E o prazer vai muito mais longe que apenas comer os buñuelos e tartas frescos. Docerias como a Mallorca e a Viena Capellanes (que são franquias grandes) são lugares bem decorados, com pinta de antigos e tradicionais. Eles embrulham os doces num papel bonito que leva o nome da doceria e amarram cuidadosamente com barbante. Fico feliz só de carregar aquele pacotinho tão mimoso até minha casa.
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Quarta-feira estive em Guernica. Não em Guernica, Vizcaya; Guernica, Museu de arte Reina Sofía. Mas foi praticamente a mesma coisa. Só que a data não era 10 de novembro de 2010, mas sim 26 de abril de 1937. Como todo o mundo, já conhecia e admirava o quadro. É um problema essa superexposição a imagens em que vivemos… A Monalisa por exemplo, em 2006. Foi um pouco decepcionante, ja conhecia tão bem o quadro sem nunca ter efetivamente lhe visto, que ao chegar naquele salão imenso cheio de seguranças, japoneses, filas e vidros a prova de balas, raio laser, bomba atômica fiquei frustrada.    
Calma, não foi isso o que aconteceu desta vez, embora tivesse um grupo de americanos malas competindo pelo espaço para tirar fotos (com tudo o que se acha na internet!!!!!!!!!!!) da obra-prima de Pablo Picasso. Mas o sentimento que tive foi justamente o oposto do que aconteceu com a Monalisa. Devido à sua dimensão enorme, por mais que o estudemos em livros e o vejamos constantemente em filmes, fotos, et cetera, nada se assemelha a visão ao vivo deste quadro. Na realidade, quase não o reconheci de cara, tive um “delay” de algumas frações de segundo ao entrar inadvertidamente na sala onde está exposto. Grata surpresa. O que mais posso dizer? É aterrador, a dor é tão explícita que dá vontade de chorar também.
É um quadro cubista, em preto e branco e acho que nunca vi uma cena mais sangrenta em toda a minha vida. Nem nesse último filme de mal gosto do Quentin Tarantino “Bastardos Inglórios”. Esta é a diferença entre os grandes artistas e estes aventureiros, que até podem ter potencial, mas são basicamente mantidos no topo por interessarem a um nicho de mercado (money, money, money, money) e por terem um público fiel que corrobora qualquer porcaria que façam. As formas do grande artista, a exterioridade de sua obra- as imagens que conjura se quiserem- são indisolúveis de seu discurso, um faz do outro mais poderoso, se sustentam mutuamente. Quanto mais coerentes entre si estes dois elementos, mais perdura a obra. Tirem-se os ríos de sangue falso de “Bastardos Inglórios”, essa glamouralização a qualquer custo da violência (que, tá bom, funciona muito bem em “Pulp Fiction”) e vejam o que sobra… Um vazio discursivo sem fim: as mesmas ideiazinhas razas e batidas hollywoodianas de sempre – e sem a menor graça - que fazem desmoronar o filme. Que me desculpem os fãs inveterados de Tarantino, mas este senhor deveria vir até a Espanha (como se diz em inglês “Get his ass down to Spain…”) e aprender com Picasso como se faz - como se fala de violência, de atrocidades, como se fala de guerra. 
Espero que não ofenda a ninguém (sim, já recebi uma pequena censura), mas é o meu blog, é só a minha opinião. Minha intenção é satisfazer a mim mesma e não atacar deliberadamente a ninguém.

lunes, 8 de noviembre de 2010

Epifanias

Tenho as epifanias mais idiotas pela manhã. Mas tem que ser manhã mesmo, quando acordo bem cedo (antes das 8) e fico meio torpe durante algum tempo. Como quando tinha 18 anos e acordava às 5 da manhã para ir para FAAP e um belo dia enquanto escovava os dentes completamente dopada de sono descobri que o Castelo de greiscou (do desenho do He-man, clássico da minha infância) era na verdade o Castelo de Grey Skull (o Castelo da caveira cinza), o que fazia todo o sentido. Era ridiculamente óbvio, mas até aquele momento não havia me dado conta e fiquei muito chocada com a descoberta – mais do que o normal devido ao estado letárgico em que meu cérebro se encontrava. Esta foi uma, mas como quase toda a minha vida tive que levantar cedo, foram muitas epifanías sem sentido.
Embora eu me sinta uma completa imbecil 2 minutos após estas descobertas matinais (pelo fato de serem tão toscas), o momento em que ocorrem é muito legal porque descobrir algo traz um prazer genuíno, e quanto mais velho a gente fica mais raras são as vezes em que somos arrebatados por esta sensação. Ficamos mais racionais (ou não…), mais pragmáticos, os livros que temos que ler mais herméticos e este prazer meio infantil de descobrir as coisas de maneira natural e sozinho vai se perdendo.
Esta semana aconteceu uma epifania matinal. Estava no metrô, em minha longa jornada até o colégio onde estou trabalhando (metrô, ônibus, mais 20 minutos a pé) e passei pela estação Colômbia. De repente tive um estalo e descobri o óbvio ululante, o porque da Colômbia ter este nome. Ai, ai.
Foi de longe, a parte mais interesante da minha viagem. Não gosto de usar transportes públicos logo cedo. Acho um pouco agressivo quando a gente acabou de acordar, muito barulho, gente, ansiedade de não chegar atrasado e irritação desnecessária quando o seu corpo ainda não está preparado. Coincidentemente hoje estava lendo um trecho de um libro do francês Marc Fumaroli, que se chama em espanhol “El estado cultural”.  Cita Saint-Exupéry, portanto vou fazer uma citação da citação:
“Ya no comprendo esas poblaciones de los trenes de extrarradio, esos hombres que se creen hombres y que, sin embargo, están reducidos, por una presión que no sienten, como hormigas, a la costumbre fijada. ¿De qué llenan, cuando están libres, sus absurdos pequeños domingos? ”
Alguém mais já viu essa cena em algum lugar? Não posso reclamar, o transporte público em Madrid é muito, muito eficaz, não dá nem para comparar com  as viagens que fiz durante 7 anos indo para a FAAP e para a USP. Mas esse conceito de que a vida tem que ser vivida desta forma no mundo todo (todos juntos de manhã indo em direção ao mesmo lugar, depois voltando a tarde, pasando 5 dias da semana rezando para que chegue o 6º e o 7º porque o trabalho é tão, mas tão mal distribuido) é massacrante. E para que a vasta maioria de nós nos submentemos a isso? Para que uma ínfima parte da população não precise e para que esta, mais uma vez, ínfima parcela viva exatamente como quer. E ainda somos tolos o suficiente para acreditar que só porque já não vivemos em regimes totalitários somos livres. Onde? Me mostra que eu perdi.
Desculpem meu desabafo. Às vezes tenho crises de ansiedade quando me lembro que infelizmente o mestrado só vai durar um ano.
No sábado fiz um programa cultural com algumas amigas do curso. Fomos a duas exposições (aliás fantásticas). Antes no entanto, tínhamos que comer, pois passamos a manhã tendo aula e já eram quase 3 da tarde. Caminhamos até a plaza de Sant’Ana onde tem muitos restaurantes com mesas exteriores. Fazia um dia maravilhoso de sol. Paramos no 100 montaditos, uma franquia madrileña que vende sanduíchinhos que custam de 1 a 2 euros (dependendo do recheio). Bem típico, gostoso e baratinho. E ao sol, já mencionei?
Ontem foi domingo, estive pela primeira vez no mercadillo del Rastro, uma feira enorme ao ar livre que acontece todos os domingos. É praticamente a 25 de março madrilenha: insuportavelmente lotado a ponto de irritar até os mais ávidos compradores. Só que, como já disse, ao ar livre e com um entorno infinitamente mais bonito e menos mal-cheiroso. Originalmente era um mercado de antigüidades, se achavam raridades, relíquias de guerra e vez ou outra até um Goya original (ainda que menor) do qual alguma familia abastada tinha que se desfazer. Hoje é uma mistura de tudo, antiqüario, artesanato de vó, feira hippie e barracas de grife (onde uma blusa de lã sintética custa mais caro que na Zara). Estava de novo com minhas amigas de máster, passamos o dia todo andando: do rastro a La Latina, a Plaza del Sol, ao cinema… Muito agradável. Futuros viajantes: 2 passeios custo baixo, que valem muito a pena.

lunes, 1 de noviembre de 2010

Samba. Samba? Samba!

                 Ritmo frenético: aulas, tarefas, palestras, seminários, conferências já programadas e muitas, muitas leituras. Tenho gostado das aulas, tenho bons profesores- em particular um ou dois que realmente se destacam- mas devo dizer que, o que mais me motiva são meus colegas de turma. Há alunos realmente muito qualificados, o que me fez perceber o quão incrível foi minha aprovação.  É uma atmosfera muito rica já que são pessoas vindas de diferentes formações e campos de atuação; são filólogos (como eu), historiadores de arte, filósofos, advogados, cineastas, publicitários, artistas plásticos e audio-visuais. Tenho um professor que já é um pouco mais velho que todos os outros. Ele me lembra muito o meu tio Rafael, tem os mesmos olhos azuis, uma expressão parecida e é um apaixonado pela literatura. Só que está mais velho e bem menos lúcido que meu tio. É boa pessoa, possui indubitável conhecimento, mas comete cada gafe! Outro dia, só para citar um fora tremendo, perguntou onde morava uma de minhas colegas. Ao saber que vivía no bairro de Vallecas, soltou um grunhido e emendou “Só tem uma menina que mora pior que você” – e citou o nome, o que eu não farei. O que me faz pensar, que meu tio Rafael, com a preparação acadêmica adequada, teria sido um bom professor de literatura.
                As criancinhas fofas na entrada do jardim botánico acabaram sendo um presságio do que estava por acontecer: depois de um mês tentado encontrar um “bico”, um trabalho de poucas horas semanais que me garantisse uma graninha extra, fui chamada para uma entrevista sexta-feira. Uma empresa de consultoria de inglês que contrata e encaminha professores para escolas e empresas. O cargo oferecido: uma turminha de 3 aninhos de idade num colégio aquí de Madrid.  Na verdade, nunca trabalhei com crianças tão pequenas, mas o entrevistador ficou muito impressionado com minha suposta experiêcia e com as respostas que dei sobre métodos de ensino e dinâmica de sala de aula. Disse que não ia me mandar para treinamento, que eu tinha o perfil e et cetera, et cetera.  E eu (obviamente) dei graças aos céus de não ter que fazer outro treinamento! FINALMENTE todas aquelas horas intermináveis de treinamento repetitivo que pressupõe que você é uma ameba incapaz de reter informação parecem ter acabado. Sério, fiz tanto treinamento nessa minha vida de professora que posso ficar mais uns 2 ou 3 anos sem me atualizar. E tomara que ele esteja certo mesmo. Porque a perspectiva de 13 semi-bebês me esperando todas as manhãs me enche de medo, para ser bem sincera. E as freiras que comandam o colégio, que obviamente vão me questionar incansavelmente sobre minhas origens e referências, me dão mais pavor ainda.
                 Descoberta da semana: La Tabacalera. Uma antiga fábrica de tabaco, convertida em um espaço cultural alternativo, auto financiado, nada de indústrias culturais, nem de políticas governamentais. O que significa que a Tabacalera é um espaço velho, bastante sujo, cujas divisões entre os salões é feita no melhor estilo “cortina de açougue”. Mas isso não faz o espaço menos interesante. No lugar convivem pacíficamente, a elite intelectual e a nova geração de artistas madrilenhos, curiosos de todas as tribos e classes sociais e imigrantes das mais diversas procedências. Ali todas as barreiras sociais e étnicas, tão latentes na vida cotidiana espanhola, parecem dissolver-se. É claro que você difícilmente encontrará os “pijos” (que são os riquinhos esnobes) freqüentadores exclusivos da Calle Serrano, rodando pela Tabacalera, mas mesmo assim, é o ambiente mais diversificado de Madrid. Oferecem aulas de espanhol para estrangeiros, oficinas de variadas formas de arte e dança (de flamenco a capoeira).
 Estive aí duas vezes, com minhas novas amigas do máster. Na primeira não havia muita coisa, só uma exposiçãozinha. Da segunda fui ver uma mostra de curtas. A mostra em si, foi igual a tantas outras em que fui – um monte de porcarias, alguns que mostram que talvez aquele(a) diretor(a) tenha potencial e 2 ou 3 que realmente valem a pena. Depois de uns 25 curtas, decidimos que já tinha sido suficiente e resolvemos sair. No salão principal, estavam preparando o palco. Vi minha primeira apresentação de flamenco – mal porque estava longe e minha altura não me favorece. E depois, grata surpresa, para acompanhar um show de pirotecnia (que também não vi direito), começaram a tocar um sambão, daqueles de escola de samba mesmo. Claro que não igual ao das nossas baterías, mas valeu a intenção. E valeu mais ainda ver a espanholada louca para se jogar de cabeça naquele ritmo delicioso e não saber sambar. Coitados. Começaram com as perninhas se mexendo desengonçadas, as cabeças balançando a esmo. O batida ficou mais forte, o ritmo mais contagiante. Não sabendo mais o que fazer, se entregaram ao samba como podiam: pulando louca e desenfreadamente em todas as direções. Ainda bem que com o barulho que ocupava cada centímetro da sala, ninguém podía ouvir minhas gargalhadas.
....

E por falar em samba, parabéns ao nosso país, por mais uma eleição realizada democraticamente. Teremos nossa primeira presidente mulher, o que significa que, apesar de predominantemente patriarcal, nossa sociedade tomou um passo importante contra uma das formas de preconceito mais vis que assola à nossa e a tantas outras nações democráticas ainda nos dias de hoje: o machismo. Isso também foi demonstrado pela grande popularidade da canditada (que era inclusive a minha), Marina Silva. Não somos mais uma selva gigante no meio da américa latina onde se usam frutas penduradas na cabeça, na visão de quem está de fora. Em questão de menos de uma década passamos a ser vistos como um país que propõe novas idéias (em diversos âmbitos, desde sustentabilidade até combate à miséria) e que, apesar de ainda lidar com a violência urbana e a pobreza, tem muito potencial. Por isso somos sim, mais respeitados.
Esperamos todos que Dilma faça um bom trabalho.

jueves, 28 de octubre de 2010

Los subidones y las ganas de bailar

De volta a Madrid, passei a semana passada a todo vapor, inclusive peço desculpas pela demora em postar – tenho feito o que posso, quando dá. O iminente início das aulas me enchia de ansiedade. Ainda não organizei muito bem minha rotina de afazeres domésticos, e sinto que às vezes acabo me perdendo um pouco no tempo. Ontem de manhã, por exemplo, gastei duas horas entre arrumar o quarto e passar a roupa da semana, que tinha lavado um dia antes e que estava empilhada na mesa da sala. Não estou reclamando, até que me divirto. Embora minha habilidade com  o ferro seja nula (tenho pensado 3 vezes antes de usar uma camisa), passo a roupa ouvindo música, cantando e às vezes até dançando. Ontem a trilha sonora teve principalmente Beatles, com direito a repetições de  “I’m only sleeping” e “It’s only love”. Ainda não aceitei bem o fato de que vou perder o show do Paul McCartney. Mas isso é outra história.
Terça-feira (da semana passada) para amenizar o estress pré-início de aulas, fiz um sanduíche às 11 da manhã, coloquei na bolsa junto com um dos libros que preciso ler para o curso e saí de casa. Fui até o parque andei um pouco e, claro, fui até a Rosaleda. Ali almocei meu sanduíche junto às flores, com um sol estupendo. De sobremesa comprei um sorvete de chocolate com amêndoas numa lanchonetezinha no próprio parque, altamente recomendado pelo senhorzinho que me atendeu. Ao caminhar em direção à saída do parque, debaixo daquele sol maravilhoso, comendo aquela delicia gastronómica fui tomada de uma felicidade súbita, ou como se diz aquí, um “subidon”. Me ocorreu que o fato de estar comendo uma bomba calórica é absolutamente irrelevante quando nos sentimos tão bem, e que realmente não me importava se nunca mais conseguisse perder aquelas calorias. Depois de meu almoço no parque continuei andando e descobri uma rua muito charmosinha só de sebos. E eles também expõem ao ar livre. Por mais legal que tenha sido a descoberta, me fez lembrar que as aulas começariam muito em breve e voltei a ficar ansiosa. Dobrando a esquina, já se via o muro do Jardim Botânico. Decidi que era para lá que eu ia, para relaxar outra vez. Nem precisei chegar lá. Na metade do camino cruzei com um grupo de crianças saindo vindo de uma excursão ao Jardim. Não tinham mais que 5 ou 6 anos de idade e estavam acompanhados de suas professoras. Todos iam em pares de mãos dadas com um amiguinho (a), felizes, rindo, falando, pulando e sorriam quando passavam por mim. Coisa mais fofa! Tive outro “subidon” e me esqueci outra vez das aulas.
O Jardim Botânico é legal, principalmente os canteiros de dálias. Mas, de verdade, nenhum parque no mundo supera o Retiro. Tenho ido correr lá com certa freqüência.  O bem estar é indescrítivel. Você está ouvindo sua musiquinha para se distrair enquanto se exercita, o sol brilha, as folhas marrons começam a cobrir o chão, passam outras pessoas se exercitando, vovôs com os netinhos, cães bonitos (saudades do Sancho!) e de repente, um esquilinho sai correndo na sua frente e pula numa árvore.
Quarta-feira estive na biblioteca pública aquí do meu bairro e me tornei membro. E para explicar para o atendente que eu eu tinha o passaporte espanhol (por tanto era cidadã), mas não o DNI (documento nacional de identidad)? Ele apontava um número que aparecia no meu passaporte (que não era o número do passaporte) e perguntava: “Mas este é o seu DNI, né?”. E eu respondia que não sabia, o que o deixava confuso... Demorou um pouco, mas deu certo. Já trouxe dois libros para casa e hoje vou buscar mais um.
                Quinta era o grande dia, início oficial.  Para me distrair, saí de casa peguei o metrô e desci na estação Anton Martín, em pleno Barrio de las Letras, antigo reduto de escritores, poetas e intelectuais. As ruazinhas caóticas, muitas só para pedrestes dão um charme especial ao bairro. Queria ver a casa de Cervantes. Hoje na verdade é um convento, só se pode ver a fachada. É um lugar interesante… nada de grifes, só lojinhas alternativas de roupas, acessórios, comics… tinha uma que vendia adesivos que diziam “Madrid - de puta madre”. Passei pela rua onde deveria entrar e nem me dei conta, então acabei dando uma volta maior pelo bairo. Foi assim que me deparei com um lugar especial – antes da casa de Cervantes. Vinha por uma ruazinha estreita que desembocava em outra, só para pedrestes. Diante de mim diviso uma vitrine repleta de calçados. Mas estes não eram calçados comuns, eram sapatos de flamenco. De vários modelos, cores, detalhes. A loja é um “taller” os sapatos são artesanalmente feitos lá. Senti meus pés com muita força me avisando – “queremos bailar”- quase movendo-se involuntariamente; foi um momento de memoria sensorial muito intenso, podía sentir o peso dos meus sapatos de flamenco nos meus pés, a altura exata que meus calcanhares ficam do solo, como mover-los, o som que se produz a cada passo e a força exata que tem que se colocar em cada movimento para que este som saia corretamente… eu ainda me lembro. Eu ainda amo estas sensações. Depois de algum tempo mais por lá, voltei para casa e comecei a me preparar para as aulas. Mas até às 16:30, horario em que começaram as aulas, tudo o que podía pensar era flamenco.
                Isso já é assunto para o próximo post, mas ontem estive num lugar chamado la Tabacalera. Descobri que dão aulas de flamenco grátis de segunda-feira às 5 da tarde. Quem sabe se minha mãe lembrar-se de enviar meus sapatos?
               

jueves, 21 de octubre de 2010

Herencia

Minha visita a Almería potencializou tudo o que eu vinha sentindo desde que cheguei à Espanha. Tem alguma coisa neste país que que faz com que tudo simplesmente flua melhor. Ainda que a minha língua nativa não seja a deles e que ainda tenha muitas referências culturais por aprender, não me sinto estrangeira. E em contrapartida, muito raramente sou reconhecida como uma. Sou livre e, ainda que seja uma liberdade assistida, comprada, finalmente sinto que estou no lugar certo.  
É sobre isso que quero falar neste texto. Sobre estes momentos em que somos tomados pela certeza de que estamos no lugar certo na hora certa, e que é muito óbvio que você só poderia estar ali.
A sensação foi crescendo ao longo dos días que passei por lá. Primeiro aconteceu passeando pelo centro de Almería com meus tios. Fazia um dia lindo de sol e passamos diante de um restaurante com mesas ao ar livre. Numa destas mesas, quatro senhoras tomavam seu café da manhã. Muito normal, se não fosse pelo fato de que todas vestiam trajes típicos “rocieros”, que eran vestidos longos de bolas, flores e peinetas no cabelo. Não resisti, tirei uma foto de longe sem que notassem, para não incomodar ninguém. Imagino que todos os leitores deste blog saibam do meu amor incondicional pelo flamenco. E ainda que estivesse na Espanha a quase um mês, não tinha visto mais que cartazes de shows pelas ruas de Madrid. Mais tarde neste mesmo dia, estava com meu primo e sua namorada ainda no centro da cidade. Visitamos a catedral, uma antiga fortaleza do tempo dos árabes, e fomos em seguida para a igreja da Virgen del Mar, a padroeira local. Já tinha um pouco de fome e sabia que minha tia estava fazendo paella, então não estava lá muito afoita para entrar. Mas, ao nos aproximarmos ouvi uma música diferente… uma guitarra flamenca… seria possível? Estava acontecendo um casamento e a trilha sonora – pirem! – era música rociera, acompanhada da melhor guitarra flamenca e cantes populares de Andaluzia. Nada de música erudita, marcha nupcial, não, não.
Reconheci um dos hits, a famosa cancão popular que diz “…olé, olé, olé, al Rocío yo quiero volver…”. A noiva, na nave principal, segurava um abanico branco de renda. E à esquerda do altar, o coro de rocieras com suas roupas de cores vibrantes com bolas, seus mantones, suas rosas no cabelo e algumas castanholas… Diante do meu choque, meu primo explicou que era um casamento tradicional, típico da região. Sem ofensas por favor, mas aquilo fez todos os casamentos em que já fui na vida parecerem um tédio sem fim. Entrei num frenezi que não consigo reproduzir com palavras, foi uma experiencia única. Pena que não deu para ficar até o final.
No entanto, o ápice emotivo desta viagem veio dias mais tarde. Estávamos em Armuña, já havia conhecido todo o pueblo - ainda que com dificuldade já que a cada metro andado, era apresentada a três pessoas diferentes –, já tinha passado umas 15 vezes na frente da casa onde minha avó nasceu e viveu, tirado fotos e então dois tios meus me levaram a Laroya. Neste vilarejo onde nasceu a minha bisavó e aí morou até os sete anos. Para quem não sabe, ela viveu no Brasil dos 7 aos 15 anos e depois voltou para Espanha devido a uma tragédia familiar. Durante estes 8 anos ela se apaixounou pelo nosso país de tal maneira que todos aqui a chamavam – e chamam até hoje- de Carmen, la brasileña. E não sossegou até que finalmente arrastou o marido e os 5 filhos pro Brasil com ela. Essa é a história bem resumida de parte da minha família.
Enfim, chegamos em Laroya, uma cidadezinha encantadora cravada na montanha. Na entrada um busto de Cervantes, que documentadamente esteve no vilarejo no ano de 1594. Me sentía como se pisasse em solo sagrado… um lugar que viu a passagem de muitos e muitos anos, sem mudar quase nada em seu aspecto físico, sua aparência. Descendo uma rua, chegamos ao final do pequeno pueblo. Daí pegamos um caminhozinho de terra, beirando um barranco e por aí seguimos entre almendros, olivos e outras árvores, arbustos e ervas nativas… Dez minutos depois lá estava o moinho de mi abuelica. Ao seu redor nada mais que a natureza. As pedras sobrepostas uma a uma há quase dois séculos atrás, ainda resitem à força dos anos. Finalmente verti lágrimas. O moinho tinha sido dos avós da minha bisavó e agora eu estava diante dele como quem vem para tomar chá e botar a conversa em dia. Tentei entrar, mas uma planta bastante espinhosa e algum entulho bloqueavam a passagem. Só conseguía chorar e pensar como aquilo seria uma moradia maravilhosa se o interior fosse restaurado. Dizem que os donos atuais não querem vender… quem sabe no futuro?
 Só de lembrar do moinho me vêm lágrimas aos olhos.
Termino este post com ninguém menos que o senhor Miguel de Cervantes, com uma frase que propiciamente estava embaixo de seu busto na entrada de Laroya.
“La libertad, Sancho, es uno de los más preciosos dones que a los hombres dieron los cielos; con ella no pueden igualarse los tesoros que encierran la tierra y el mar: por la libertad, así como por la honra, se puede y se debe aventurar la vida.”
Uma frase de quase 500 anos, gravada na entrada de uma vilazinha perdida no tempo, explicou  tudo o que estou sentindo, o que venho sentindo desde que este novo projeto de vida começou a tomar forma. E explica tudo o que sentiu minha bisavó há 60 anos atrás. É ou não é pura emoção?

martes, 19 de octubre de 2010

Viajar, comer, viver

Sempre demos risada da minha avó pela quantidade obscena de comida que ela costuma fazer e colocar em nossos pratos. Festas em familia e reuniões em sua casa são sinônimos de comilança sem tamanho seguida daquela depressãozinha típica que acompanha a barriga estufada. Assim, acreditava eu que já estava devidamente preparada para o que me aguardava gastronômicamente em minha viagem para sua terra natal.
 Pois para minha surpresa, descobri que os longos anos de Brasil já domaram, e bastante, os hábitos alimentícios de minha familia no que diz respeito à quantidade. Passei 6 dias sem sequer sentir fome, e no entanto não parei de comer. E mesmo quando tentava dar um basta, não era possível. Afinal não sentir fome em qualquer hora do dia é algo inconcebível.
Para os que pensam em vir futuramente, vai um dicionário de significados:
-          Dizer “No puedo más”, significa “Sim, por favor, quero mais uma porção bem generosa”
-          Dizer “Muy bien, como uno más”, significa “Certo, vou repetir mais 3 vezes”
-          Dizer “No tengo hambre” significa “Quero mais opções de comida do que as que estão expostas na mesa”
-          Dizer “En serio, es que no tengo hambre, ni un poquito” pode significar:
a)      Não gosto da sua comida (o que é o maior insulto da vida)    ou
b)      Ponha comida AGORA no meu prato
Tive mais convites para comer do que dias para ficar. As pessoas são muito generosas, queriam me receber bem, que lhes fizesse uma visita. E não pode haver visita, sem comida. Numa destas visitas comi “fritada de conejos”, um prato que amo imensamente. Não só havia a fritada, mas também uma mesa de embutidos (jamón, chorizo, morcilla…), salada e tortilla de patata, tudo muito apetitoso. A prima me serviu, acho que tinha um coelho inteiro no meu prato. Estava maravilhoso, ela cozinha divinamente. Comi até o final com muito esforço, para não fazer feio. Ao terminar, me diz a prima “Echate un poco más, no has comido nada”, e em seguida já virou uma colher com mais 4 pedaços no meu prato. Ao terminarmos de vez- me sentindo como uma bola prestes a sair rolando – ela observa que nem toquei na tortilla…. Passamos umas duas horas conversando, o almoço ainda na barriga. Me perguntam se não quero magdalenas com café. Digo que não, não tenho fome, o que é respondido por uma cara que é um mixto de dor e descrença. Começo a rir, abraço a prima querida e tento convencê-la de que realmente não preciso comer.
Em outra ocasião fui levada para almoçar em vilarejo muito bonito na costa. Uma vila de pescadores, uma jóia do mediterrâneo. Comi lulas, salada, batata frita, mexilhões e mais 3 tipos de peixe. No final até os gatos, que parecem ser a fauna nativa de Almería devido a sua abundância, disfrutaram dos anéis de lulas à dore que ninguém agüentava mais comer, ainda que fossem uma iguaria dos deuses. Vocês imaginam como eu devia estar absolutamente empanturrada para não conseguir comer mais 5 anéizinhos de lula suculentos…. E ainda teve sobremesa. A viagem de volta à Almería (capital) não tardou mais que uma hora e assim que chegamos no apartamento, a tia perguntou: “quer comer uns figos e uns docinhos de Armuña?”….
Num outro jantar, havia muitas opções para “picar” como eles dizem aqui, para petiscar- lulas, jamón, salada de romã e outras gostosuras. Fui colocando tudo aos pouquinhos no prato e provando, pois ainda estava satisfeita com o lauto almoço que me havia sido servido horas antes. A tia me olha e diz: “A mí no me gusta echarle comida a nadie, pero si no vas a comer nada, yo lo haré”.
Eles sabem que a comida que fazem e servem, é muito boa. Compartilhá-la  é sinal de afeto, ainda que tenhamos que comer até cair.
Diversas vezes dei gargalhadas por conta desse exagero tão bonitinho. Mas o mais surreal veio na hora da partida… Balanço total: 1,5 quilos de amêndoas recém colhidas, um cacho de uva tão grande que enchia uma sacolinha de supermercado, 12 barrinhas de sabonete artesanal feito com azeite extra-virgem e ervas colhidas no campo, 2 potes de pêssego em calda caseiro e por fim 15 litros de azeite artesanal puríssimo, extraído das azeitonas armunhenses. E ainda queriam me dar figos. Óbvio que não trouxe tudo isso para Madrid, senão ainda estaría empacada na porta do trem. Me senti como o pessoal do ceasa, trazendo produtos frescos do campo para a cidade. Dos 15 litros de azeite, só trouxe 7 e as uvas ficaram para trás também. O azeite está fazendo o maior sucesso aqui em casa. Uma das compis, ao prová-lo disse “¡Pero eso viene con la aceituna junto!”. De verdade, é o melhor azeite que já comi em toda a minha vida, não tem igual. Um dos potes de pêssego já foi devidamente consumido por nós acompanhado de chantilli. E as amêndoas, bem… são consumidas diariamente. Hoje por exemplo, fiz almôndegas recheadas com amêndoas cobertas com molho de tomate fresco (nada de latinha!). E domingo foi risoto de aspargos com amêndoas e queijo brie. As receitas fizeram sucesso, recebi elogios e pedidos para ensiná-las.
O duro foi chegar às 11:30 da noite com uma mochila pesada, uma bolsa estufada, um casaco e uma sacola com 7 litros de azeite que rasgou no caminho. Ao entrar desengonçadamente na Calle de Espartinas, desatei a rir. Vi a cena se repetindo pela segunda vez. Dessa vez, pelo menos tinha as chaves.

miércoles, 13 de octubre de 2010

Corazón Andaluz

Almería; En árabe, espejo del mar. El mar imita el cielo, ambos del mismo color azul.
Aquí nació una de mis abuelas y mis tios… Al estar en su pueblo, Armuña – dónde ya no se ve el maravilloso mediterráneo -,  he tenido la rara sensación de tener raíces aquí aunque nunca haya visitado esta tierra antes. Mi familia andaluza es… no sé decirles qué. Son más que las palabras que mi débil español pueden decir. Es como si nunca hubiera salido de casa. Es como si estuviera en casa de mis abuelos  en compañía de mis primos y tíos.
Y se lo agradezco a mi abuela Leonor  porque la quiere tanto su gente que a mí, al principio una total desconocida, me trata como una reina.
                Sin más, me enseñan sus fotos, me cuentan sus memorias,  me llevan a pasear, me abren sus puertas, me invitan a comer, me abrazan, me besan,  me cortan el pelo (¡está monísimo!), me dan las llaves de sus casas y – claro- me echan mucha, MUCHA, MUCHA comida (ri-quí-si-ma). Llevo unos pocos días aquí y muy pronto volveré a Madrid, pero estos pocos días han sido suficientes para que los quiera muchísimo, para siempre.
Sin embargo, no es sorpresa que me haya enamorado de ellos… porque esta tierra y esta gente es sólo corazón.  Está en todo que hacen y dicen-  en sus frutas recién cogidas, en sus risas, en su vocabulario regional, en su amable acogida, en sus recetas magnificas, en sus aceites y jabones artesanales;  es el órgano que los mueve a todos. ¿Qué decir? Pues sí, ya los amo. Entiendo ahora porque les escribe con tanta pasión mi abuela. Porque una vez que conozca a gente así, uno jamás querrá alejarse.

jueves, 7 de octubre de 2010

Antiblog

Não consegui escrever esta semana. Muita ansiedade por conta da aula inaugural (que acontecerá em algumas horas) e dos muitos contratempos burocráticos entre USP e Complutense. Nunca tive problemas com o cartão de crédito também e foi só aterrizar aquí para me dar conta de um sério problema com a  fatura…  Enfim… Estive em Toledo ontem e nem as lágrimas de emoção que quase rolaram dos meus olhos ao ver a muralha do século IX em torno daquela cidadezinha tão bela, e toda aquela atmosfera mística de séculos de conquistas, reconquistas e de herança cultural de diversos povos diferentes conseguiram me dar boas idéias para um texto. E há meia hora começou a me dar uma cólica muito chata. Blé!
                No entanto, aqui vai uma passagem marcante.
                Segunda-feira estive no templo de Debot. É um templo egipcio que foi dado de presente à Espanha e colocado magistralmente no topo de uma colina com um jardim em volta. Tudo isso está bem no meio da cidade (pertinho da Plaza España). O templo, originalmente contruído em homenagem ao deus Amon, hoje se encontra em posição privilegiada. O pôr do sol dali é um espetáculo a parte, certamente o mais bonito de Madrid, talvez da Espanha.
                Eram seis da tarde, 16 graus, vento frio. O lugar estava qualhado de gente: jovens sentados na grama, esportistas em seu exercício diario, cachorros com seus donos, turistas com suas máquinas, senhores e senhoras aproveitando o sol. Ainda faltavam duas horas para que escurecesse.  Num banquinho junto à parte detrás do templo, sentou-se uma senhorinha muito bonitinha, seu cabelo parecía um chumaço gordo de algodão, bem, bem branquinho. Como uma tartaruga, enfiou metade da cabeça dentro do cachecol rosa que usava e logo adormeceu. Sentou-se outra senhora ao seu lado logo depois, mas teve o cuidado de não despertá-la.
                Passados alguns minutos, eis que chega um joven muito animado com sua câmera, provavelmente nova, daquelas tão profissionais e estratosféricas que devem até ter função cafeteira acoplada. Bom, aí ele viu a pobre velhinha dormindo e é claro, pensou em fazer a foto do ano: espontânea, real, maravilhosa. De dar inveja ao próprio Ansel Adams! Sem a menor cerimônia, ajoelhou-se ao lado dela – ainda adormecida – e começou a bater fotos de seu rosto. A outra senhora, que estava bem acordada, fez uma cara de reprovação impagável e indignada começou a olhar para os lados em busca de apoio… acho que se ela tivesse uma bengala ou guarda-chuva  o rapaz estaria com um galo até hoje. Porém, ao não pronunciar-se verbalmente, talvez até por receio de acordar a vizinha de banco, o moço tirou todas as fotos que quis levantou-se e foi embora.  Mal sabe a senhorinha que a esta altura já virou celebridade no facebook, ou em algum blog por aí… o que me faz pensar – quantos de nós também não estamos a revelia em facebooks e blogs por aí? Que medo!
Amanhã vou à Almería passar uns días com primos da minha avó. Vou conhecer onde ela nasceu, e onde parte da minha história, da minha existência, também começou. Ainda que nunca tenha estado lá, sinto como se este fosse um regresso. Tenho pensado muito na abuelica, que é como todos chamávamos minha bisavó, dona Carmen,  no  trajeto que ela fez e em como tudo poderia ter sido diferente para minha avó e tios se ela não tivesse transformado seu ambicioso sonho de ir ao Brasil em realidade na metade dos anos 50. Ela viveu ainda 18 anos depois que eu nasci. Nos víamos sempre, conversávamos. E agora me dou conta do quão pouco realmente a conheci. E o mais estarrecedor é que chego a conclusão de que ao  sermos completamente opostas, somos na verdade completamente iguais.
E torço por mais inspiração.
Até a volta.

sábado, 2 de octubre de 2010

Obra Prima

Ontem  fi z uma viagem no tempo. E aterrisei na corte de Felipe IV, rei de Espanha. A infanta Margarita e uma de suas amas me olhavam com desconfiança e a toda aquela gente fazendo burburinho e torno delas. O cão nos ignorava, nem piscou em sua soneca vespertina mesmo com a criança que insistia em colocar o pezinho em cima dele. Lá do fundo da sala um homem se virou para dizer-me algo, mas com todo o tumulto não pude ouvir. E lá no canto esquerdo, quase escondido por sua enorme tela, estava ele. Ninguém menos que ele, o reponsável por todo aquele tumulto.
Está claro que não se trata de uma cena qualquer, por mais corriqueira que ela possa parecer. Ele, engenhoso que é, a montou meticulosamente, e a fez repleta de truques, segredos, charadas. Mais! Ao nos observar tão cheio de rigor e concentração ele faz com que nós todos que a viram, vêem e verão, em qualquer lugar ou época,  personifiquem os próprios Felipe IV e Mariana de Asturias. Ontem eu também fui rainha. Eu vi. Em um instante estava ali naquele mesmo salão onde estavam ele, a pintar-nos o retrato, e todos os outros a olhar-me.
Uma experiência deveras contemporânea para um quadro de 1656. Não acham? Mas é precisamente esta a faísca que faz com que hoje em dia vastos grupos de turistas ainda sejam atraídos com seus fones ou com seus guias tagarelas – o que é muito pior – até aqui. Esta tela nos apresenta muito mais que movimento, técnica, beleza… está muito além disso. Aliás, o que vi ontem está muito além da pintura, da estética, de tudo. Este quadro está vivo. Esta obra se coloca diante de nós como uma porta para um outro lugar, num outro tempo e fazendo-o nos tornamos parte viva dela. Nossa, por assim dizer, participação o torna dinâmico, eternamente mutável. Está em constante atualização.
Ao mesmo tempo seu autor, muito graciosamente, nos dá o inestimável presente de, ao estarmos diante dele, nos eternizarmos também.
Al señor Diego Velázquez,
 ¡Muchísimas Gracias!

jueves, 30 de septiembre de 2010

Pequeñas Histórias


Outra manhã o telefone tocou às 9 e 20. Atendi. Ela quería falar com o colégio Nuestra Señora del Pilar. Informei que era engano. Pediu que eu confirmasse o número e eu respondi que não lembrava de cabeça, mas disse que aqui era um apartamento, uma casa. A mona ainda me perguntou se não era um instituto de alunos e pelo tom, não havia gostado muito da minha resposta. Será que ela achou de verdade que eu era  secretária e estava mentindo porque não quería atendê-la?
Viva, este momento finalmente chegou! Minha primeira “mala sem alça experience” aquí na Espanha!
 Depois de meia hora o telefone tocou novamente. Era um homem desta vez. Procurava pelo colégio Nuestra Señora del Pilar.
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Meu porteiro (o homem que não estava lá) é uma figura engraçada. Bigode e cabelos pretos, nem alto nem baixo sempre de macacão azul (os porteiros usam macacão azul e os mecânicos vermelho). Macacão mesmo, igualzinho aqueles de fábrica, inclusive  a cor, aquele inconfundível azul royal fabril. Sempre que passamos e damos “Buenos días\tardes?” ou o que seja  ele responde “Buenaaaaaaaaas”. Outro dia ao voltar do banco me rendi aos encantos de uma “pastelería” charmosa aquí no quarteirão e comprei uma empanadilla. Estava maravilhosa e eu nem sei direito o que tinha no recheio, sei que era com tomate. Ao chegar na porta do prédio ele estava do lado de fora. Como é meio desconfortável dizer “oi” e “tchau” para mesma pessoa varias vezes ao dia – este dia particularmente saí e entrei umas 3 vezes durante a manhã – resolvi não sei porque cargas d’água oferecer um pedaço da empanadilla enquanto passava. Ele recusou “Qué no, que yo con los dulces ya no puedo más”. Eu respondi que não era doce ao que ele respondeu “No, pero me ha prohibido el doctor”. Eu demonstrei interesse “¿En serio? “. Aí ele encontrou o que precisava, alguém para desabafar – “Sí, me dice el doctor que estoy gordo! ¡Qué ya no puedo comer! “. Já não dava para ignorar “No me lo digas…”. Ele prosseguiu desanimado “Sí, pues me están haciendo pasar un hambre…”.Fiquei com pena pois fazer regime é uma penitência mesmo. Fazer a siesta todo o dia de barriga vazia ninguém merece. Consolei o colega “A veces los doctores no saben lo que dicen”. Ele mais que imediatamente concordou “El hambre que me hacen pasar…”. Antes que ele me mostrasse a receita médica, disse rindo “Pues, no te pongas enfermo por lo que dicen los doctores.” já abrindo a porta do elevador.
Acho que ele ficou contente. Quando saí de novo me apresentou o cunhado, Manolo, que é porteiro no prédio da frente (imaginem a cena, dois Mário Bros azuis conversando na calçada) dizendo “Este es mi cuñado, cuando no esté yo y necesites algo, puedes pedirle a él.” Imagina se tivesse oferecido um “bocadillo de calamares"!
Aliás, nada como almoçar um bocadillo de calamares sentada num banquinho no Paseo del prado olhando o museu do outro lado da rua e a Plaza Neptuno a esquerda.
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Momento 3 Patetas da semana
Segunda-feira comemorei uma semana de Espanha. Descobri que posso fechar a janela do meu quarto (terça foi a primeira manhã em que não acordei com os raios de sol na minha cara). Lembram da duchinha? Achei o suporte, agora tomo banho em pé. Foram necessário 7, isso mesmo, 7 dias.
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Curiosidade
A exemplo de Ulisses (o odisseu), Aquiles(o peleio) e tantas outras personagens épicas que há milenios povoam o imaginário dos povos ocidentais, Kaká, o nosso ex camisa 10 que joga no Real Madrid, tem epíteto aqui na Espanha. SEMPRE que alguém se refere a ele dizem – “Kaká, el evangelista”.

miércoles, 29 de septiembre de 2010

Quem tem medo de touradas põe o dedo aqui...

Esta segunda acabei demorando demais resolvendo coisas por aqui – supermercado, cartório, ligações para o serviço de informação (seguindo o sábio conselho do meu mais novo BFF aquí em Madrid, Nílton, estou em busca do meu DNI, que é como o RG espanhol ao qual eu tenho direito), lavando os lençóis (e comprando outros novos pois só tinha um jogo) então acabei não saindo. Quando já eram 5 da tarde e tinha resolvido tudo, ainda fazia muito sol então eu TINHA que ir para algum lugar.
 “Já sei, Plaza de toros”. Sabia que era só seguir reto pela Calle de Alcalá que eu chegaria lá. Não vou mentir, o caminho não foi um dos mais belos de Madrid. Mas nem por isso menos interesante… As docerias que passei pelo caminho! Uma mais sedutora que a outra, não são aqueles doces plastificados… parece tudo muito fresco e delicioso, tortas, biscoitinhos, muitos com frutas ou amêndoas… Ai, ai.
Cheguei na tal plaza de las Ventas, onde uma charmosa construção anuncia “Plaza de Toros, 1929”. A idade do meu vô Durval. Fui ver o preço dos ingresos. Alguns baratos até, 4,60 euros. A questão é- quero eu ir a uma tourada? Estou em conflito total! A principio não quería ir de jeito nenhum e estava fora de questão. Mas a gente aqui leva as touradas muito a sério. Sério a ponto de os filhos de toureiros célebres – que inclusive já morreram  de “una corneada” – se tornarem celebridades também. É o exemplo do galã ídolo de todas as espanholas, Cayetano, filho do já falecido Paquírri. E eu só descobri isso porque muito inocentemente comprei um postal com uma pintura de um toureiro, imitando cartazes antigos. Minha compi viu e me perguntou se eu era fã do Paquírri (nome no cartaz reproduzido no postal). QUEM???? Aí discorreu inclusive sobre os casos amorosos dele. Ela não é desta parte da Espanha, portanto presumo que realmente toda a Espanha acompanha esse tipo de evento (tirando a Catalunha agora). Uma outra española me garantiu que eu tenho que ir para ver o traje de sol, que é belíssimo (como são bordadas contas douradas ao traje, quando o sol bate o toureiro brilha). Uma terceira que quando  pegam no lugar certo e o touro morre sem sofrer nada, é muito bonito. Quando disse à segunda que não quería ver o touro morrer ela respondeu “Haz lo que siempre hago, tapate los ojos cuando lo vayan a matar y estará muy bien”. Confesso que fiquei curiosa, e até entendo o ponto de vista de que é “bonito” uma morte bem matada. Até porque às vezes o toureiro também morre e mesmo assim muitos espanhóis ainda se aventuram nessa por vontade própria.
 Por outro lado, antes de vir para cá estava um dia passeando num pier com meus país e um homem fisgou um peixe. Vi o peixe se debater em vão enquanto o homem buscava seu facão. Quase chorei por esse peixe.
Pergunta retórica - Será que não existe uma tourada fake?

lunes, 27 de septiembre de 2010

Comendo e festejando no final de semana

Tenho tido muita sorte. Desde que cheguei… Aliás desde antes de sair do Brasil pois consegui fazer contato com pessoas honestas e boas através de indicações de amigos e da internet,  inclusive  foi assim que consegui  este apartamento aonde vivo muito bem instalada e tranqüila.
Estar desde o começo entre espanhóis (sejam eles legítimos ou aqueles que já estão aqui há tanto tempo que já têm a cara e o jeito do lugar) tem diversas vantagens e sinto este país abrir-se cada vez mais diante de mim como um leque, revelando-se. E vou ficando cada vez mais fascinada.  A primeira vantagem óbvia é a prática constante da língua (eu que o diga morando com duas bascas cujo sotaque é totalmente novo para meus ouvidos destreinados). E o vocábulário inútil, então!!!!!
-          La curva de la felicidad – a famosa pança de chop.
-          La picaresca – é a malandragem, sabem, o jeitinho que se dá para todas as situações. O que me faz pensar…  se eles se acham malandrinhos, o que eles achariam de nós que efetivamente infringimos leis?
-          Guay – é uma daquelas palavras que serve para qualquer coisa dependendo da entoação. Minhas compis me traduziram como “Cool” com um L beeeeem puxado a la espanhola. “¿Hay chocolate? ¡Guay!”
-          Fuerte –  muito bom, de respeito.  “¿Pues hablas ruso? ¡Qué fuerte!”… mais ou menos isso.
-          La burbuja individual de cada uno- bem essa não é tão inútil, é o espaço individual de cada um que não deve ser ultrapassado para a boa convivencia de todos.
-          Cutre – de má qualidade, seria como o nosso “podre”. “La ropa de Blanco (loja aquí da Espanha) es muy cutre”.
E por aí vai, não consigo lembrar de tudo, mas tenho ouvido coisas geniais. Mas os privilégios estão muito longe de parar na maior gama lexical que agora possuo. Sexta-feira, por exemplo, fui convidada a dar um passeio com um casal muito simpático. Ambos estão “en el paro”, tem em torno de quarenta anos e alugam quartos em seu apartamento no bairro de Salamanca. Acabou não dando certo de eu alugar um desses quartos – outra moça chegou antes – mas a mulher, que foi com quem havia tratado, gostou de mim e quis me conhecer pessoalmente. Fomos ao palacio real, à catedral de Almudena, Madrid de los Asturias e o passeio foi coroado com a gloriosa Plaza Mayor. Depois voltamos andando pela Calle Alcalá até Salamanca aonde todos moramos. Festival de gargalhadas. Primeiro foram as fotos, quando  a mulher perguntava ao marido – que ia bater as fotos – “¿Se me ve la tripa?” - para quem não entendeu, ela perguntava se dava para ver a barriguinha. Ela estava de dieta e certamente queria que todos pudessem notar o resultado. Até que pelas tantas, dentro de um bar super pitoresco (voltarei a ele) em plena plaza mayor, ele disse  “No se nota porque además lo más bonito de la foto son los jamones.”, se referindo à dúzia de presuntos serranos pendurados no fundo. Ao chegar no famoso urso de bronze foi uma batalha de que sís y qué nos para responder a minha pregunta se haviam ursos em Madrid. Quando ele não gostava de alguma pintura ou estátua, ou qualquer coisa, ela dizia “es ingeniero, los ingenieros no entienden de estas cosas…” e por fim, ao chegarmos a Puerta de Alcalá ela entoou alegremente “Mirala, mirala, la Puerta de Alcalá. Mirala, mirala la Puerta de Alcalá….”, uma canção tradicional que debe ser mais velha que a abuelica. Teve de tudo, até foto na frente de uma vitrine que dizia “¡Viva el pulpo Paul!”. Quase agradeci eles de joelhos pelo passeio tão divertido! É o tipo de vivencia que simplesmente não tem preço porque você deixa de ser um turista comum.
O final de semana aqui é agitadérrimo. Para começar, na sexta tudo fecha mais cedo e as pessoas vão para a casa entre 14.30 e 15.00. Claro, eles precisam descansar um pouco antes  de badalar, e não chegar em casa mortos e serem obrigados a comer pizza em casa e dormir assistindo a novela das 8.
Muita gente reclama, que os espanhóis isso, aquilo, são rudes, fecham tudo na siesta, et cetera, et cetera … da mesma maneira que falam de outras culturas e povos também. Mas este é o tipo do comentário meio preconceituoso  de quem acredita nessa baboseira de que a globalização só traz vantagens e não faz o mínimo esforço para entender e respeitar o que lhe é estranho ou simplesmente alheio aos seus costumes. Na verdade, é muitíssimo simples se dar bem com os espanhóis. Basta entender seus rituais, parte importantíssima do seu dia bem como deles próprios, e respeitá-los, ainda que nãos  os siga. E eles estão repletos deles, entre os quais se encontra a famigerada siesta, por exemplo.
 Gostaria de compartilhar agora alguns destes rituais aos quais estive presente ao longo do final de semana.
Comida.
Não se misturam pratos diferentes numa refeição. Se por exemplo, se preparam 1 tortilla, 1 prato de lulas e 1 prato de salada, eles servirão um por vez, e nada de pegar um pouquinho de cada. No restaurante, se sair com espanhóis a mesma coisa. Eles vão pedir algo para “picar”, que é tipo uma entrada que pode ser quente fría, qualquer coisa, e depois outros pratos, mas se for dividir pratos se come um por vez e quando se termina um retira-se o prato e põe-se outro. Uma pena para mim, que ADORO misturança.

Tapas.
Um dos conceitos mais geniais do UNIVERSO! Não são todos os bares que aderem à esse estilo, mas lembra do bar pitoresco mencionado antes?(by the way, as fotos do bar estão no facebook) Então, chegamos ao bar e eles pediram bebidas, pediram uma para mim também. Para a esposa, só agua, lembrem-se que ela estava de dieta. Aí ela disse ao garçon “Traenos unas tapas, por favor.” Simples assim. O garçon chegou com um pratinho de paella cada um. Quando ela disse que eu era do Brasil e estava visitando ele trouxe mais um potinho de gazpacho cada um. Comecei a ver um monte de gente chegar e lá vir o garçon com o pratinho de paella… Quando entendí que estavam dando a paella, perguntei “¿Tu le dices que quieres tapas y ellos te dan comida?” “Sí”, disse a esposa. Ainda não acreditava muito “¿Y no pagas?”. Aí ela me explicou que hoje  em dia  é meio a meio – alguns cobram, mas muitos ainda não. Ainda que em porções pequeñas, é comida de graça.
Fiesta.
Bem o momento que todos esperavam. A famosa fiesta madrileña.
Tudo começa às 8 da noite quando todos começam a se mobilizar para o jantar, afinal a noite vai ser muito longa, é necessário estar bem alimentado pois saco vazio não para em pé, muito menos dança até às 5 da manhã. Prepara-se a comida com calma e come-se com calma… daí vem a arrumação. Moro num apartamento com 2 outras garotas e havia neste dia (sexta-feira) mais uma amiga da Esther, portanto não tenho como dizer o que fazem os rapazes. Mas 9.45 à meia-noite as meninas se arrumam, provam 15 modelitos diferentes, se maquiam, se penteiam – as espanholas sabem mesmo fazer isso, me sentí completamente humilhada…. – e põem seus melhores acessórios. Quando eran 15 para meia-noite eu já tinha desencanado de fiesta, presumi que não ia rolar mais nada e estava conversando com meus país no msn. Só escuto a voz da Esther “Niñas, salimos en 15 minutos”. Saí correndo, peguei a primeira roupa que vi na frente, joguei um mousse no cabelo dei tchau pros meus país e pro Marcos no msn e fui.
Mas, ainda não fomos para a fiesta. Antes da fiesta tem a confraternização social e assim fomos parar num bar. Era aniversario de um colega de trabalho de uma de minhas compis. As pessoas foram receptivas sem serem malas, sabe, do tipo que fica fazendo mil perguntas…Como era um cumpleaños, ganhamos cartõezinhos para trocar de graça no bar pelo que quiséssemos. Quando eran já 2 e pouco começou a movimentação para efetivamente “salir de fiesta”. Onde ir? O pessoal escolheu a Nells. Bem badaladinha, cheia de gente bonita, toca rock especialmente dessas bandas moderninhas. A entrada? 10 euros. Sim, lazer é barato aquí.
Entre os colegas de trabalho da compi tinha um argentino que me perguntou de que parte do Brasil eu era. Quando disse São Paulo ele disse que nunca tinha estado em SP, mas sim em Maresias. E emendou “Pues había una fiesta muy, muuuuy cara allí.”. Dei o nome da balada (todo mundo sabe qual é) mas disse que eu mesmo nunca havia ido. Ele “Sí, 80 reais! Puff! Eso es demasiado.”. É, de fato, DEMASIADO. Ainda mais porque a balada em si é uma coisa meio… universal. É praticamente igual em todo o lugar, e a balada que fui em Madrid me pareceu com outras que já fui no Brasil, na Holanda, se tivesse ido na China teria sido também. No começo é muito divertido, estão todos animados e dançam para valer. No final o lugar já fica cheio de bêbados chatos que pisam no seu pé e tropeçam em você e aí eu não vejo a hora de ir embora. Mesmo assim, valeu a pela experiencia. Como aprendi aquí, na pior das hipóteses “se me ha quitado el bailado”.
E se você chegou ao final deste texto, PARABÉNS!

sábado, 25 de septiembre de 2010

Hoy sólo quiero hablar de rosas

De todas las flores las que más me encantan son seguramente los claveles. Sin embargo, también me gustan las rosas por su olor fuerte  y su belleza clásica. El otro día estuve en el parque otra vez. Me encaminaba a la Plaza de Neptuno y me ha dado ganas de ir por el parque, así que me fui.
Me perdí.
 Estén tranquilos, fue intencional. En principio seguí las direcciones del mapa pero de repente me di cuenta de que seguía por un sendero desconocido. Se me gustó y decidí seguirlo un poco más. He notado más que nunca durante estos días que de hecho llega el otoño. Las hojas viejas ya marchitadas empiezan a cubrir el suelo con sus tonalidades de marrón y amarillo y aunque los árboles sigan verdes, ya se ve que poco a poco, hoja por hoja cambian de color. He estado sola por algún tiempo hasta que alcancé una madre con dos niños. Lo más grande no tendría más que 7 años y el más pequeño 5. Venían de la escuela. La madre con sus maletas y los niños le acompañaban charlando y jugando con piedritas. Y yo, como ellos, me sentía segura cerca de la madre así que me dejé conducir, quedándome siempre un poco atrás. No sé cuánto tiempo hemos pasado así hasta que estábamos delante del Casón del buen Retiro. No estoy segura que les pasó, pero creo que allí los niños y su madre, que sin saberlo habían compartido conmigo, salieron del parque. Yo, maravillada con el jardín que se extendía delante de mis ojos muy pronto los olvidé. Sin rumbo otra vez, llegué al memorial de las víctimas del atentado de 2005. No había nada, ni siquiera pájaros…
Fuentes, gentes, bicis y cuando me entero dónde estoy… Mis pies me habían llevado otra vez a la Rosaleda, un jardín precioso dónde sólo se plantan rosas de todos los tipos. Todavía no se han marchitado y huelen bajo el sol. De todos los colores, tamaños…. PRECIOSAS. Allí me quedé escribiendo, pensando y respirando el aire impregnado de las rosas.
No quiero salirme de este jardín, y me da pena que tan pronto estará muerto.
La inminente ausencia de las rosas me llena de vacío. Hoy les he echado mucho de menos a mi familia y amigos...
Un beso muy grande desde España. Mañana vuelvo a escribirles en portugués, que el texto no me sale muy bien en español. Y les hablaré de las fiestas españolas, así que no dejen de leerlo.

jueves, 23 de septiembre de 2010

"Mãe, manda o Sancho que eu vou ficar"

Como todos sabem, o Sancho é o meu amado cão. Agora ele provavelmente acha que eu morri porque infelizmente não acredito que os cães entendam que os donos foram fazer mestrado na Espanha e voltam já. Mas eu sinto muita falta daquele monte de pelos saltitante, não importa o quão fedido ele fique no final de semana. Toda vez que vejo um dono feliz com seu cachorro na coleira, me lembro do Sanchico e de como nosso bairro era horrível para passear com o cachorro por causa da sujeira, calçadas quebradas ou a falta delas. Mesmo assim, ele adorava passear e acho que nunca o levei suficiente.
Outro dia dobrei uma esquina qualquer aqui em Salamanca (bairro) e me deparei com um largo ensolarado, cheio de crianças brincando supervisionadas por seus pais. Havia uma escultura bonita e os típicos predinhos charmosos de Madrid. Tudo banhado pelo sol e já eram quase 7 da noite. Que felicidade. A frase simplesmente ecoou na minha cabeça.
“MÃE, MANDA O SANCHO QUE  EU VOU FICAR!”
Estou tão apaixonada por esta terra que nem os milhares de posteres do novo filme da Julia Roberts (“Come, Reza,  Ama” em espanhol) espalhados em todos os quarteirões de Madrid, junto com a propaganda da Lancôme que TAMBÉM estrela a Julia Roberts, consegue tirar o meu humor. Mas ela quase, por muito pouco conseguiu. Foi quando cheguei em plena Plaza del Sol e me deparei com um prédio inteiro coberto por uma Julia tamanho Itu, com uma pazinha de sorvete na boca, tentando ignorar a câmera. Era perceptível pelo pôster, imagine só no filme. Foi por pouco, mas nem tentando competir em metros quadrados com a Puerta del Sol ela conseguiu.
Ainda estou em lua de mel.
E não me levem a mal, amo minha terra natal. Mas é extremamente fácil se acostumar com o que é tão escandalosamente mais justo, sadio e bem estruturado. A relação das pessoas umas com as outras e com o espaço que as cerca aqui é muito… sã. Essa é a palavra.
Anteontem ao jantar minha compi Itzi me explicou como funciona o sistema de votos espanhol. Fez severas críticas e disse que esse sistema político atual que estimula o bipartidarismo faz com que os ideais dos espanhóis não estejam sendo efetivamente representados no governo.
Vocês deviam ver a cara que ela fez  quando contei que no Brasil se elegem celebridades da tv, da industria fonográfica de má qualidade e da industria pornográfica para cargos no congresso e no senado.
Para vocês terem um vislumbre do momento, a frase que acompanhou a cara foi um pausado “No me lo creo” com a mão sendo levada à boca, momento de perplexidade extrema. 
Ah, se a câmera fotográfica estivesse ligada!
Pena que não é piada. A maneira que tratamos nossa nação é idêntica à maneira como tratamos uns aos outros. Resumindo - muito, muito mal. 

miércoles, 22 de septiembre de 2010

Taming the inner beast

Hoje acordei ao som de um salto alto. Tacones (suena mucho mejor en español porque la palabra remite al ruido que hacen los tacones –tac, tac, tac…). 
Minhas “compis de piso”  saem cedo e trabalham o dia todo. E eu me sinto uma verdadeira preguiçosa.  Ainda mais porque as aulas ainda não começaram e como me informaram ontem na secretaria da faculdade, só começarão quase na metade de outubro. E o atendente ainda pergunta “No ha recibido el correo?... CRIATURA, óbvio que não! Se assim fosse, teria vindo dia primeiro de outubro, não 19 de setembro, 20 dias antes das aulas! Mas, como diz o ditado, o que não tem remédio…  Não ia eu começar a bater boca com o secretário e dizer que “No hay derecho”, “Como puede que no me hayan avisado???”,  et cetera…  To be, or not to be IN MADRID. That is the question. O que fazer até então, senão assumir que estou de férias e aproveitar a paisagem? E que paisagem, minha nossa!
Pois foi assim que me encontrei ontem, depois de sair da faculdade, passeando pela Calle Serrano. Puro glamour. Carolina Herrera, Agatha Ruiz de la Prada, Yves Saint Laurent, só estrelas. Passei pela loja da camper. Sapatos. Sapatos lindos, tão lindos. Minha boca salivou, andei alguns passos a mais tentando me desvencilhar daquela vitrine, mas era tão, TÃO difícil. Lá de fora vi um sapatinho cinza. Saltnho baixo, bico redondo, delicado com um pequeno detalhe em vinho. Vi tudo isso ainda na calçada, vejam só. Entrei, meu bom senso me puxando para fora. Peguei o sapatinho na mão… Ai, era couro, muito macio e com uma textura linda o salto levemente estilizado. Quem está lendo este texto e gosta de sapatos sabe do que estu falando. Olhei o preço, 120 euros. Saí da loja. SEM OS SAPATOS. Mas antes sem eles do que sem juízo. Cheguei a calcular o preço no meu ipod que tinha levado para ver o mapa de onde tinha que ir. Mas lembrei-me que agora não estou ganhando dinheiro AT ALL e o que tenho é para as prioridades (curso, comida e teto). Não para um sapato de 120 euros, infelizmente. Senti falta do meu antigo emprego e de ter uma renda garatida, poder comprar o que me desse na telha. Mas isso nem durou 2 segundos porque olhei ao meu redor e vi aonde estava…  quem precisa de sapatos novos quando se está em Madri?
 Continuei andando e descobri que a salivação era fome, tinha que voltar para casa aonde uma bandejinha de cogumelos me esperava para ser refogada com cebola. Quem me conhece bem sabe que ao longo dos últimos anos, durante os quais passei a ganhar mais, desenvolvi uma delicada relação com o consumo, principalmente de items como roupas, sapatos e acessórios a ponto de gastar uma porcetagem razoável dos meus ganhos com isso. Se tornou muito difícil para mim pensar duas vezes antes de comprar uma nova blusa, um novo par de sapatos ou uma bolsa, não importasse o preço .  Comprar virou uma válvula de escape para tudo o que dava errado ou que me deixava desgostosa. Enfim, a conclusão é que se eu tivesse sido mais prudente, teria muito mais recursos hoje. E, mais uma vez, aqueles de vocês  que tem vivido mais próximos de mim, podem imaginar a sensação que eu tive ao colocar aquele belo pedaço de couro moldado de volta no lugar sem ao menos experimentá-lo.
Puerta de Alcalá a um quarteirão dali. Tirei o sapato da cabeça, fui para casa, preparei uma comidinha, dei uma descansada e resolvi ir até o parque. Passei 3 horas incríveis, completamente sozinha com a minha câmera, sem absolutamente nenhuma peça de roupa nova.  Y me lo pasé E-S-T-U-P-E-N-D-O.  
Saindo de lá, lembrei-me que precisava de um protetor solar para o rosto, o meu tinha acabado e tem feito muito sol. Novamente fui a Calle de Goya, cheia de lojas incríveis. Me impus um teste e fui entrando em todas as que gostava, vi peças lindas, algumas baratas mas não levei nada.  Até que na ZARA, me rendi. A culpada? Uma blusinha do Pato Donald estilizada. Preço? 9,95 euros. Não consegui me conter. Peguei fila e tudo.
Ao chegar em casa abri meu armario e procurei um cantinho para guardar a blusa nova. Olhei minhas coisas, as blusinhas que havia trazido. Tenho aquí menos da metade das coisas que tinha no Brasil. Mesmo assim, ao guardar a blusinha, disse a mim mesma “Agora chega. Não preciso de mais nada.”. E foi assim, neste preciso momento, em que senti um estalo, e alguma coisa de fato se rompeu . Pela primeira vez, desde que me tornei adolescente  até a minha vida adulta, senti, ou melhor eu soube com clareza, que meu armário estava cheio.

Meu armário finalmente está cheio, não preciso de mais nada.