jueves, 7 de octubre de 2010

Antiblog

Não consegui escrever esta semana. Muita ansiedade por conta da aula inaugural (que acontecerá em algumas horas) e dos muitos contratempos burocráticos entre USP e Complutense. Nunca tive problemas com o cartão de crédito também e foi só aterrizar aquí para me dar conta de um sério problema com a  fatura…  Enfim… Estive em Toledo ontem e nem as lágrimas de emoção que quase rolaram dos meus olhos ao ver a muralha do século IX em torno daquela cidadezinha tão bela, e toda aquela atmosfera mística de séculos de conquistas, reconquistas e de herança cultural de diversos povos diferentes conseguiram me dar boas idéias para um texto. E há meia hora começou a me dar uma cólica muito chata. Blé!
                No entanto, aqui vai uma passagem marcante.
                Segunda-feira estive no templo de Debot. É um templo egipcio que foi dado de presente à Espanha e colocado magistralmente no topo de uma colina com um jardim em volta. Tudo isso está bem no meio da cidade (pertinho da Plaza España). O templo, originalmente contruído em homenagem ao deus Amon, hoje se encontra em posição privilegiada. O pôr do sol dali é um espetáculo a parte, certamente o mais bonito de Madrid, talvez da Espanha.
                Eram seis da tarde, 16 graus, vento frio. O lugar estava qualhado de gente: jovens sentados na grama, esportistas em seu exercício diario, cachorros com seus donos, turistas com suas máquinas, senhores e senhoras aproveitando o sol. Ainda faltavam duas horas para que escurecesse.  Num banquinho junto à parte detrás do templo, sentou-se uma senhorinha muito bonitinha, seu cabelo parecía um chumaço gordo de algodão, bem, bem branquinho. Como uma tartaruga, enfiou metade da cabeça dentro do cachecol rosa que usava e logo adormeceu. Sentou-se outra senhora ao seu lado logo depois, mas teve o cuidado de não despertá-la.
                Passados alguns minutos, eis que chega um joven muito animado com sua câmera, provavelmente nova, daquelas tão profissionais e estratosféricas que devem até ter função cafeteira acoplada. Bom, aí ele viu a pobre velhinha dormindo e é claro, pensou em fazer a foto do ano: espontânea, real, maravilhosa. De dar inveja ao próprio Ansel Adams! Sem a menor cerimônia, ajoelhou-se ao lado dela – ainda adormecida – e começou a bater fotos de seu rosto. A outra senhora, que estava bem acordada, fez uma cara de reprovação impagável e indignada começou a olhar para os lados em busca de apoio… acho que se ela tivesse uma bengala ou guarda-chuva  o rapaz estaria com um galo até hoje. Porém, ao não pronunciar-se verbalmente, talvez até por receio de acordar a vizinha de banco, o moço tirou todas as fotos que quis levantou-se e foi embora.  Mal sabe a senhorinha que a esta altura já virou celebridade no facebook, ou em algum blog por aí… o que me faz pensar – quantos de nós também não estamos a revelia em facebooks e blogs por aí? Que medo!
Amanhã vou à Almería passar uns días com primos da minha avó. Vou conhecer onde ela nasceu, e onde parte da minha história, da minha existência, também começou. Ainda que nunca tenha estado lá, sinto como se este fosse um regresso. Tenho pensado muito na abuelica, que é como todos chamávamos minha bisavó, dona Carmen,  no  trajeto que ela fez e em como tudo poderia ter sido diferente para minha avó e tios se ela não tivesse transformado seu ambicioso sonho de ir ao Brasil em realidade na metade dos anos 50. Ela viveu ainda 18 anos depois que eu nasci. Nos víamos sempre, conversávamos. E agora me dou conta do quão pouco realmente a conheci. E o mais estarrecedor é que chego a conclusão de que ao  sermos completamente opostas, somos na verdade completamente iguais.
E torço por mais inspiração.
Até a volta.

4 comentarios:

  1. A velhinha já deve estar na internet com certeza. E quanto a Toledo, a cidade é realmente mágica, né? Eu desci aquelas ruazinhas até a parte baixa da muralha onde dá pra ver o rio e quem disse que conseguia voltar? Gente, que desespero! Isso pq eu tinha um mapinha na mão, mas aquelas ruas sem nome e todas tortas não ajudaram muito. As aulas logo começam, hein, Rachel? Good luck!

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  2. Thank you, Edson!
    Isso é que é amigo! Viajando e ainda assim acha um tempinho pra postar no meu blog!
    ahahahha, se achar em Toledo? Só pra profissionais!

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  3. Infelizmente, naum posso falar nada de Toledo, mas vi um episódio quase igual em Londres: um cara queria tirar foto de um menino com trajes tipicamente africanos e o pai dele xingou o turista de tudo que é nome e quase bateu nele, pura poesia...

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  4. Ai ai! Esse templo é realmente magnífico! Fecho os olhos e vejo. O por do sol fica colado na sua retina e depois na sua memória. Um espetáculo! Fico imaginado eles montando essas pedras, como se fossem peças de Lego. Respire fundo. Cartão de crédito, burocracias uspianas,cólicas, tudo isso é muito medíocre e passageiro. Tudo vai dar certo, Rach.

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