lunes, 1 de noviembre de 2010

Samba. Samba? Samba!

                 Ritmo frenético: aulas, tarefas, palestras, seminários, conferências já programadas e muitas, muitas leituras. Tenho gostado das aulas, tenho bons profesores- em particular um ou dois que realmente se destacam- mas devo dizer que, o que mais me motiva são meus colegas de turma. Há alunos realmente muito qualificados, o que me fez perceber o quão incrível foi minha aprovação.  É uma atmosfera muito rica já que são pessoas vindas de diferentes formações e campos de atuação; são filólogos (como eu), historiadores de arte, filósofos, advogados, cineastas, publicitários, artistas plásticos e audio-visuais. Tenho um professor que já é um pouco mais velho que todos os outros. Ele me lembra muito o meu tio Rafael, tem os mesmos olhos azuis, uma expressão parecida e é um apaixonado pela literatura. Só que está mais velho e bem menos lúcido que meu tio. É boa pessoa, possui indubitável conhecimento, mas comete cada gafe! Outro dia, só para citar um fora tremendo, perguntou onde morava uma de minhas colegas. Ao saber que vivía no bairro de Vallecas, soltou um grunhido e emendou “Só tem uma menina que mora pior que você” – e citou o nome, o que eu não farei. O que me faz pensar, que meu tio Rafael, com a preparação acadêmica adequada, teria sido um bom professor de literatura.
                As criancinhas fofas na entrada do jardim botánico acabaram sendo um presságio do que estava por acontecer: depois de um mês tentado encontrar um “bico”, um trabalho de poucas horas semanais que me garantisse uma graninha extra, fui chamada para uma entrevista sexta-feira. Uma empresa de consultoria de inglês que contrata e encaminha professores para escolas e empresas. O cargo oferecido: uma turminha de 3 aninhos de idade num colégio aquí de Madrid.  Na verdade, nunca trabalhei com crianças tão pequenas, mas o entrevistador ficou muito impressionado com minha suposta experiêcia e com as respostas que dei sobre métodos de ensino e dinâmica de sala de aula. Disse que não ia me mandar para treinamento, que eu tinha o perfil e et cetera, et cetera.  E eu (obviamente) dei graças aos céus de não ter que fazer outro treinamento! FINALMENTE todas aquelas horas intermináveis de treinamento repetitivo que pressupõe que você é uma ameba incapaz de reter informação parecem ter acabado. Sério, fiz tanto treinamento nessa minha vida de professora que posso ficar mais uns 2 ou 3 anos sem me atualizar. E tomara que ele esteja certo mesmo. Porque a perspectiva de 13 semi-bebês me esperando todas as manhãs me enche de medo, para ser bem sincera. E as freiras que comandam o colégio, que obviamente vão me questionar incansavelmente sobre minhas origens e referências, me dão mais pavor ainda.
                 Descoberta da semana: La Tabacalera. Uma antiga fábrica de tabaco, convertida em um espaço cultural alternativo, auto financiado, nada de indústrias culturais, nem de políticas governamentais. O que significa que a Tabacalera é um espaço velho, bastante sujo, cujas divisões entre os salões é feita no melhor estilo “cortina de açougue”. Mas isso não faz o espaço menos interesante. No lugar convivem pacíficamente, a elite intelectual e a nova geração de artistas madrilenhos, curiosos de todas as tribos e classes sociais e imigrantes das mais diversas procedências. Ali todas as barreiras sociais e étnicas, tão latentes na vida cotidiana espanhola, parecem dissolver-se. É claro que você difícilmente encontrará os “pijos” (que são os riquinhos esnobes) freqüentadores exclusivos da Calle Serrano, rodando pela Tabacalera, mas mesmo assim, é o ambiente mais diversificado de Madrid. Oferecem aulas de espanhol para estrangeiros, oficinas de variadas formas de arte e dança (de flamenco a capoeira).
 Estive aí duas vezes, com minhas novas amigas do máster. Na primeira não havia muita coisa, só uma exposiçãozinha. Da segunda fui ver uma mostra de curtas. A mostra em si, foi igual a tantas outras em que fui – um monte de porcarias, alguns que mostram que talvez aquele(a) diretor(a) tenha potencial e 2 ou 3 que realmente valem a pena. Depois de uns 25 curtas, decidimos que já tinha sido suficiente e resolvemos sair. No salão principal, estavam preparando o palco. Vi minha primeira apresentação de flamenco – mal porque estava longe e minha altura não me favorece. E depois, grata surpresa, para acompanhar um show de pirotecnia (que também não vi direito), começaram a tocar um sambão, daqueles de escola de samba mesmo. Claro que não igual ao das nossas baterías, mas valeu a intenção. E valeu mais ainda ver a espanholada louca para se jogar de cabeça naquele ritmo delicioso e não saber sambar. Coitados. Começaram com as perninhas se mexendo desengonçadas, as cabeças balançando a esmo. O batida ficou mais forte, o ritmo mais contagiante. Não sabendo mais o que fazer, se entregaram ao samba como podiam: pulando louca e desenfreadamente em todas as direções. Ainda bem que com o barulho que ocupava cada centímetro da sala, ninguém podía ouvir minhas gargalhadas.
....

E por falar em samba, parabéns ao nosso país, por mais uma eleição realizada democraticamente. Teremos nossa primeira presidente mulher, o que significa que, apesar de predominantemente patriarcal, nossa sociedade tomou um passo importante contra uma das formas de preconceito mais vis que assola à nossa e a tantas outras nações democráticas ainda nos dias de hoje: o machismo. Isso também foi demonstrado pela grande popularidade da canditada (que era inclusive a minha), Marina Silva. Não somos mais uma selva gigante no meio da américa latina onde se usam frutas penduradas na cabeça, na visão de quem está de fora. Em questão de menos de uma década passamos a ser vistos como um país que propõe novas idéias (em diversos âmbitos, desde sustentabilidade até combate à miséria) e que, apesar de ainda lidar com a violência urbana e a pobreza, tem muito potencial. Por isso somos sim, mais respeitados.
Esperamos todos que Dilma faça um bom trabalho.

5 comentarios:

  1. Dizem que sala de criança pequena é pior que de pré-adolescente...boa sorte! haha

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  2. As crianças pequenas não podem ser piores que os adolescentes!! Vc vai arrasar!
    Adorei este post com um pouquinho de cada assunto. E, quanto ao último comentário, Marina tb era minha candidata. Não votei nela pq estava viajando no 1º turno.
    Boa aula, bom trabalho!!!

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  3. Divirta-se com os pequenos! Com eles você vai perceber a dimensão de ser professora e, apesar de parecerem tão indefesos, irão lhe proporcionar novíssimas descobertas.

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  4. Ai, Lu, a única descoberta que fiz até agora é que eu nÃO sei ensinar inglês pra 23 crianças entre 2 e 4 anos, por mais fofos que eles sejam. Aliás não sei ensinar nada pra 23 crianças que variam de 2 a 4 anos. Simplesmente não é possível pra mim.

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  5. Raquel,

    Nem sempre sobra tempo pra comentar, mas tenho lido os textos do seu blog e fico feliz de ver que consegue expressar de forma tão clara e sincera, os sentimentos mágicos que tem vivido aí na espanha.
    Acredito que, nossa família do Brasil tem conseguido partilhar boa parte dessa sua experiência e dos ricos detalhes que você consegue expressar quando descreve as pessoas especiais de nossa família, dos sabores, cores e imagens dessa terra tão linda.

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