martes, 29 de marzo de 2011

"Estoy harta de ser buena" o el efecto borde

borde (adj m/f) - grosso (a)

"Borde!" me peguei gritando outro dia pra um cara na fila na frente da Casa América. Basicamente, o que aconteceu é que estávamos Olga e eu imaginando se aquela fila era para uma peça de teatro gratuita que haveria ali. Quando nos encorajamos a questionar um casal que estava na fila o "borde" se intrometeu: "Pra fila!", disse apontando com o polegar o fim da fila. Em choque, pedimos calma já que só estávamos pedindo informação. O "borde" prosseguiu, o polegar ainda no ar:  "Não estão vendo que estão dando ingressos?"... respondemos em uníssono "Não." O "borde" então, não só não pediu desculpas, mas continuou falando com aquela cara de quem acha que tem razão... eu não ouvia mais nada, o sangue subindo.... De repente escuto a Olga: "Usted es un mal educado!" e minha voz passando por cima da sua em alto e bom som "BORDE!". A fila começou a andar e o homem, sem me responder, andou com cara de reprovação. Olhei para o lado, incrédula. Uma senhorinha passava... tinha visto e ouvido tudo. Olhou pra mim e começou a dar risada. "Então, acho que devo ir pro final da fila", disse rindo e passou.

Verdade seja dita, nunca fui super calminha de levar desaforo pra casa - a não ser que seja estritamente necessário para o bem de todos, inclusive o meu - desde meus 12 anos, mais ou menos. Desde bem antes até. Xingo de volta no trânsito, sou ríspida com atendentes mal-educados, e já cheguei a enfrentar professor e até chefe... meus pais então coitados, sempre com a menina respondona que não aceitava não como resposta sem antes perguntar "porque não?" - embora sempre tenha sido muito obediente, gostaria de frisar. E não digo que me orgulho de ser temperamental. Até porque ser desse jeito é na verdade uma maneira que algumas pessoas, e eu obviamente, acham pra se defender, pra lidar com a agressividade alheia, e não é das mais eficazes. O fato, no entanto, é: preparem-se amigos e familiares, mas volto ao Brasil com a casca mais grossa do que nunca. Graças a 6 meses de Espanha. Não estou me queixando, resmungando, criticando... só constatando. Já me flagrei dando patadas bem dadas -como nunca antes - em bibliotecárias mal-educadas, atendentes mal-humoradas, garçonetes grossas e até um policial (calma, tive o cuidado de só dizer um "Estás de broma!", nada pelo que pudesse se ofender). O único lugar onde já segurei a onda muitas vezes é aqui em casa, mas até isso tem ficado mais difícil. E eu sei que não era assim. E por um lado é extremamente libertador, já que tenho engolido muito menos sapos. Por outro, acho que às vezes posso atingir quem não merece, inconscientemente, só pelo fato de que eu já não lido com as pessoas da mesma maneira e com a mesma doçura - a exceção de quem é realmente próximo.

Sempre que assitia "Mulheres a beira de um ataque de nervos" me partía de la risa, como se diz aqui. Aquela mulherada tresloucada, com umas reações completamente exacerbadas.... mas agora, no entanto, eu realmente compreendo aquelas mulheres e suas motivações não me parecem em absoluto absurdas, ao contrário, me parece muito natural que se sintam assim. Me encontrei diversas vezes sentindo-me como a Pepa (personagem interpretada pela incomparável Carmen Maura) que ao virar uma caixa inteira de sonífero num liqüidificador cheio de gazpacho, diz memoravelmente: "Estoy harta de ser buena!". Estas palavras adquiriram um novo sentido pra mim aqui. Viver na Espanha é uma experiência extraordinária, fiz amigos maravilhosos, estou constantemente rodeada de gente querida. Mas um país tão nacionalista - tá bom, chega a beira do provincianismo bairrista às vezes -, com tantos preconceitos entre seus próprios habitantes, exige invariavelmente que todos tenham que agarrar seu espaço, nem que seja no dente. E é assim que a coisa funciona. E se você não entra na dança, morre pisoteado pelo "taconeo". Adotar essa atitude dramática, impulsiva que por vezes se transborda em grosseria parece ser o único jeito de estar na Espanha amando-a. Resumindo, você aprende a ser grosso pra não deixar que a grosseria dos outros estrague o seus dias ensolarados. Assim, todo mundo se irrita por 10 segundos, troca desaforos, depois vai todo o mundo pra casa e em 10 minutos ninguém se lembra de nada. O pior é que... eu acho que lá no fundinho.... sempre fui um pouco assim. E as pessoas que são super-mega-ultra sensíveis sempre foram um problema pra mim, já que elas tendem a demorar pra entender que mesmo sendo meio "borde", eu realmente gosto delas e não gosto de machucar ou ofender ninguém. Se me irrito é por 10 segundos e depois acabou.

O que não dá pra conceber é quando as pessoas vem com racismos eurocêntricos ou te humilham pessoalmente num ambiente universitário, onde se imagina que essas coisas não existam. Aí a coisa fica feia, e ainda que a Pepa e seu gazpacho envenenado me venham à cabeça, o melhor a fazer é respirar fundo e usar todo o meu brasileiríssimo senso diplomático. E aquele sorriso impecável. Funciona sempre.

Pero en realidad os digo... a veces esta gente me pone harta de ser buena.

2 comentarios:

  1. Muito bom esse seu post! Tão bom quanto o próprio filme citado que, pra mim, é um dos melhores de Almodóvar!

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  2. Meu Deus! Por que meu nome aparece como Edson - SANTO ANDRÉ? De onde veio esse SANTO ANDRÉ!?

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